quinta-feira, 21 de abril de 2016

Poesia e retórica

Eis um soneto em que se vê um belo exemplo de retórica, assemelhando-se a um texto dissertativo, mas em linguagem poética. Apresenta-se também como um texto metalinguístico, porque o argumento sustentado pelo autor é justamente a valorização da forma textual. Olavo Bilac defende a tese parnasiana segundo a qual o poeta deve prezar pelo valor estético de sua obra e que esta produzirá o efeito esperado pelo artista.


A Um Poeta

Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha e teima, e lima , e sofre, e sua!

Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço: e trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua
Rica, mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E natural, o efeito agrade
Sem lembrar os andaimes do edifício:

Porque a Beleza, gêmea da Verdade
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.


No primeiro quarteto o autor introduz o tema e diz: “[O poeta] trabalha e teima, e lima e sofre, e sua”. No segundo quarteto ele recomenda e argumenta: “Mas que na forma se disfarce o emprego do esforço”, ou seja, que o poeta não expresse emoções, mas priorize a temperança “como em um templo grego” e, sobretudo, o valor formal [estético] do seu engenho [o fazer poético]. No primeiro terceto o autor reforça o argumento: “Não se mostre na fábrica o suplício do mestre”. Isto significa que a composição não deve enfatizar o sentimento do poeta, mas que o efeito “agrade sem lembrar os andaimes do edifício [i.e: que o resultado final seja belo sem lembrar o trabalho de composição]”. No terceto final, Bilac conclui dizendo que a Beleza [a estética] é a Verdade, inimiga do artifício [do sentimento produzido em poesia], e que a Beleza se encontra na simplicidade [de conteúdo].

Os poetas parnasianos defendiam a arte pela arte, o culto à forma, rejeitando as emoções exacerbadas e os conteúdos elaborados. Eles foram uma antítese ao sentimentalismo romântico e à poesia social dos realistas.


Nota pessoal
Como leitor, valorizo a subjetividade da poesia romântica e o engajamento político do Realismo, mas não posso negar que Bilac desenvolveu uma excelente argumentação capaz de defender a proposta artística parnasiana e de questionar os movimentos literários que a antecederam.

Observe que as minhas paráfrases sobre trechos citados não dão conta de explicar totalmente o que o autor diz em linguagem poética, porque esta forma de linguagem expressa um nível de raciocínio que a linguagem dissertativa não é capaz de atingir sem simplificar a riqueza semântica e formal do texto poético.


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